quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Pés e folhas

Ágrama voltava de mais uma de suas noites cotidianas pela cidade, com seu passo apertado na certeza de que tinha um maço de cigarro fechado em casa. Seus passos descalços (pois andar de salto alto requer uma certa complexidade que no momento foi trocada pela praticidade) desviavam dos lixos, cacos de vidro e poças ressecadas que um dia marcaram terriório de algum homen sapiens na busca de sua prenda. A idéia de um atalho parecia mais do que atraente naquele momento, mas sabia que deveria passar por um parque que poderia ser sua porta de entrada pra um assalto ou até coisa pior, desses aí que lemos nos jornais e ignoramos de forma banal.
As solas dos seus delicados pés estranharam o contraste do concreto que deu lugar a uma grama mal tratada, mas que conservava alguma maciez, um conforto, uma quentura que não sentia já tinha certo tempo. O cigarro...foda-se, pois catou na sua bolsa e ainda possuía o último da dinastia dos 20. Apesar de retorcido como as árvores daquela paisagem aparentemente estéril, sua habilidade manual para deixa-lo novinho foi utilizada e já estava pronto para ser degustado. O seu medo de concreto e vidro, assim como o seu relógio agonizante deram um tempo pros seus sentidos mais primitivos, o cheiro daquelas plantas, o pisar na grama o som de um vento morno. A solidão de um pedaço de chão verde dentro de um grande tabuleiro cinza a fez caminnhar vagarosamente e descalço, pois já não era mais a praticidade desejada, mas sentir aquele ambiente.
Ao encarar uma árvore na área central do parque, teve a sensação de uma segurança que nem seus inúmeros beijos e sexos poderiam lhe proporcionar. Sentou-se um pouco e ficou a olhr para o nada, pois seus olhos não estavam acordados, mas sim a segurança que sentia diante de uma simples árvore.
A última fumaça que dissipa as folhas de tabaco acordam para que olhe seu relógio, o pulsar do seu marcador do tempo gritou junto com uma mensagem via celular. Era hora de ir pra casa, era hora de passar pelo ritual de embelezamento, pois apesar de noite, a madrugada estava começando a levantar e Ágrama estaria pronta (como todas as sextas) para se embalar junto dela, mas será que seus pés pisariam na grama novamente?