segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Desclaça sobre taças vazias...

O bico fino envernizado combinava perfeitamente com sua bolsa da mesma cor e se misturava com sua blusa irregularmente cortada composta por uma estampa de zebra. Ágrama estava linda para o seu safari urbano. Pronta para caça e tentando ignorar presenças esperadas por ela, mas contorcia-se e produzia um pequeno manual de como seria se visse rostos familiares esperados e desprezados.
Suas mãos tateiam os dedos de Isabel até que estejam firmes com as suas até que declara:

- Vamos ao bar?

Proposta aceita por Isabel com um sorriso malicioso de quem estava sedenta por recipientes etílicos injeridos em pequenas doses ou grandes, que possuem cores e cheiros sedutores.

Ágrama desliza sua unha recém pintada pelo cardápio e pede uma bebida nova. Esta menina em corpo de mulher procuraria desafiar seus limites físicos ao selecionar uma quantidade tão grende de álcool em um copo. Isabel mantém a tradição pedindo o de sempre, como se fosse o seu feijão-com-arroz das sextas.
Copos tocados, cigarros acessos e o salto desliza para a pista de dança. Um cheiro de outras bebidas se mistura com olhares, fumaças, balançar de corpos. Uma lascividade deixava aquela atmosfera insuportavelmente deliciosa. Seu país de uma hora atrás na mesa do bar se fragmentou e só estavam ali as curvas de Ágrama e os braços finos de Isabel deslizando pelo ar.

-Isabel, vou retocar minha maquiagem.

-Te acho depois. Responde Isabel de forma mecânica sem olhar para amiga, porque seus olhos estavam voltados para um rapazote que a olhava a cada 20 segundos contados por ele. Seguido de olhares para o nada, para depois voltar seus olhos para ela.

Enquanto Ágrama patina pelo chão da boate levemente grudento, dispara sorrisos rápidos e superficiais. Promessas de adicionar pessoas no orkut que ela nem lembraria no dia seguinte (e não adicionaria) e abraços sinceros com seres que ela gostaria de ter uma concivência mais intensa, mas pra falar a verdade, já basta encontrar na boate e pronto.
Ao mecher na maçaneta do banheiro com uma das mãos e com o batom na outra para retocar seus lábios, deu o primeiro passo para sua desgraça. No sentido oposto passava um trem em alta velocidade que esmagaria seu corpo e seu coração. Ágrama sente seus pés presos em trilhos e a velocidade do trem não diminuiria. Ao abaixar levemente a cabeça, foi despedaçada exatamente naquele momento.

-Olá, como vai? Pergunta Helena.

O liquidificador que misturou os ingredientes que estavam despejados em copos de bebibas flutuantes na boate era o mesmo que mexia e remexia todas as suas emoções naqueles poucos segundos. Seu rosto queimou e suas pernas vibravam como as cordas do baixo de Helena.
Um silêncio explodiria em algo que Ágrama não contolaria. Uma bomba estava prestes a explodir e voariam pedaços para todos os lados, mas levantou levemente seu lábio superior exibindo um sorriso diplomático e respondeu:

-Estou bem...

-Bom te ver por aqui, preciso ir. Helena passaria por ela e se distanciaria.

Três passos de distância e Ágrama só consegue ver o rosto daquela mulher que convervava uma candura muito paticular, o seu cheiro empregnou em Ágrama. É verdade, o mesmo cheiro que cotidianamente Ágrama se viciava estava mais uma vez entranhado na sua pele. Seu sorriso, sua voz, suas idéias, seu sexo, seu gemidos e seu abrir de olhos a cada manhã que acordavam juntas. Ágrama sentiu dores. Seu corpo se tatuava com aquelas lembranças, seu coração foi marcado novamente com uma marcação de ferro quente e o sangue jorrava de suas chagas. Sua feridas explodiram, mas Isabel lhe deu um forte abraço ajudando a cicatrizar algo que não pode ser comparado com a dor.
Maquiagem retocada e Ágrama saiu do banheiro como se saísse do purgatório com uma máscara branca sem expressão. Com um andar felino, rápido e preciso, chega ao bar e faz: "uni-du-ni-tê. Salamê-mi-güê. A bebida escolhida vai ser esta da-qui...".
Uma roleta russa Ágrama procurava. Cada resultado era uma bebida ingerida rapidamente até o momento que ela não conseguiria mais pronunciar tais palavras que eram tão populares entre as crianças de sua rua na sua infância. Um nublar a envolveu e uma cegueira proposital ocorreu, acompanhada de um apagar de raciocínio. Tudo preto e todo silêncio do mundo ao redor dela...

Barulhos de carros ao longe, um vento artificial (será que é um ventilador de teto?), algo esta por cima dela, mas não pesa muito. Seus olhos se abrem como duas grutas que estavam seladas por pedras.
Um teto familar, um cheiro familiar, uma dor de cabeça familar (todos os sábados pelo início da tarde). Estava em seu apartamento quando sua racionalidade estava sendo religada e ao se sentar na cama percebeu que um outro corpo estava depositado ali. Um medo a dominou, pois era como se estivesse em um necrotério temendo levantar o lençol. Ao olhar para o relógio ouviu:

-Boa tarde. A voz de Ivan entrou e passou pelos seus ouvidos...

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