domingo, 20 de maio de 2007

"One of many zeros"

Ao primeiro passo que eu dou para trás me assusto ao ver meu celular sendo dado a um estranho que me ameaçava. Chego perto deles e me vejo parado sem olhar para trás estendendo minha mão fria que ainda conservava o gelo do último copo de gin misturado com tônica dando o "fetiche da mercadoria" mais badalado dos últimos anos. Olho para o meu rosto mais pálido que normal e percebo a minha indiferença burguesa que dizia: Tanto faz, daqui a pouco eu to com mais um para ser levado por alguém que me faça sentir que estou contribuindo com uma certa caridade. Três passos para trás e olho um quarto em que paguei para estar ali. Luzes cafonas refletindo a bandeira do fluminense e uma água que nunca está numa temperatura apropriada, mas ignoro tudo isso porque tenho nos meus braços um pedaço de mundo que ainda to tentando descobrir adormecendo no meu peito. Depois dessas duas tentativas, resolvi andar para trás e para trás.
Não consegui mais visualizar com tanta clareza certas sensações, pois tudo começou a passar mais rápido. Rostos, cheiros, risos, músicas, lágrimas abraços, beijos, gemidos, gritos silenciosos, bebidas e tudo mais estavam passando numa velocidade intangível. Fui fazendo questão de correr para o lado oposto (fazendo questão mais ainda de pular de costas quando me vi no meu ensino médio).
Tombos, choros, colos, o leite com chocolate na cama, ursos de pelúcia, afagos, o desembulhar de presentes estavam se distanciando até que num piscar de olhos abertos pela primeira impressão senti o cheiro materno de novo tão forte como nos velhos tempos de 20 poucos anos atrás.
Com uma insegurança de movimentar-me com um pequeno passo para trás resolvi fazer olhando minha coragem de se levantar pela primeira vez para dar o primeiro passo para frente. Ao realizar tal proeza, me vi diante de um grande vazio da cor que me viria a cabeça no primeiro instante, ou seja, um grande azul. A partir disso, o grande azul poderia tomar formas de objetos, humanos e percebi logo que eu estava no meu prórpio zero absoluto. O meu primeiro passo em frente seria recomeçar tudo com 24 anos acumulados, mas daí pensei: O que eu mudaria? Tudo foi tão detalhadamente construido. Açucar, afeto, sangue, risos, lágrimas e sensações construíram tudo aquilo que eu vi passar. Ao me sentar, se é que isso era possível no nada absoluto, eu percebi que perderia pessoas que amo, pessoas que não quis conhecer e pessoas que odeio. Todas elas colocaram um tijolo ali. Algumas retiram de suas casas, outras colocaram de mau jeito pra que tudo pudesse cair um dia e outras depositaram o objeto de argila e foram embora.
Pensei em recomeçar dali colocando papéis me indicando quais pessoas eu deveria reencontrar, mas qual seria a graça de não ter mais o primeiro riso junto, o primeiro beijo, o primeiro sexo, o primeiro abraço e o primeiro olhar? Mesmo com oportunidade de não "errar" mais, resolvi ficar com minha pequena casa e meus tijolos tortos. Corri um pouco, abri os olhos. Vejo o azul novamente e percebo que o teto do meu quarto precisa de uma pintura nova.

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